Bato à porta de um sonho e pergunto se posso entrar. "Já
estás dentro dele, agora desenrasca-te!", dispara o subconsciente em tom
ameaçador.
Assim, entro numa garagem de livros e sento-me num bloco de notas,
qual indigente da literatura!
Ali, pouco mais faço do que arrumar o pó às capas...
Passam-se horas, dias, anos, até que desperto com o bater de uma
porta! Olhei, e era a porta da realidade!
O Tempo acaba de chegar do trabalho! Senta-se e desfolheia as
horas, enquanto folheio um livro de retratos! Vem zangado, resmungando que está
a ficar velho!
De seguida entra a Infância, com um rosto pouco satisfeito! Desabafa
que tropeçou na Idade, que lhe terá dito para nunca crescer!
Junta-se a nós a Imaginação! De mochila às costas e com ar
cansado, comenta que regressa de uma viagem, qual ecdemomaníaco em busca de um
nada que o preencha!
E ali estávamos nós: Eu, o Tempo, a Infância e a Imaginação! Todos
dentro do mesmo espaço, a sala dos sonhos!
Sem nunca interferir observo a calma a ser varrida para a calçada
da realidade.
Afinal do que sei eu?
Afinal do que sei eu?
Lembro-me de pensar que em cada um de nós existe pelo menos uma
sala de sonhos, mas é comum esquecermo-nos onde escondemos a chave!
Em menos de nada, enche-se de gente a garagem de livros!
Alguém a quem tiram fotografias e oferecem os parabéns, prepara-se
para vender uma palestra (chamar-lhe-ia antes um monólogo de ideias).
Seguiram-se aplausos ao invés de interrogações!
É uma sessão de autógrafos! Numa garagem
de livros? Com que direito?
E eu, que não raras as vezes tenho de pedir a palavra para
escrever, rabisco no papel palavras esquecidas e outras que não se deixam ver! Chamo-lhes de ideias brancas, aquelas que saltam do papel de novo
para a imaginação, como de saudades se tratassem! Um novo tipo de vacuidade
intelectual, portanto!
Saí, e fui dar uma volta aos pensamentos! Ficaram-me a doer os
pés!
Já pensei em oferecer os meus sonhos. Não faço nada com eles, ou
faço muito pouco! Sou uma fraude, não me pertencem!
Li uma vez que o inferno somos nós! Isso não sei, não é uma
afirmação minha! Mas com certeza vivemos num mundo cão, em que é aconselhável
prender as nossas próprias ideias com cadeados para não sermos assaltados!
Para os mais distraídos, o melhor é descobrir uma forma de viver, porque
de morrer há muitas! Não serão poucas as pessoas com saudades de si próprias!
Regresso à garagem de livros, agora desprovida de alaridos ou de prepotências!
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